max imdahl, professor catedrático de história da arte da universidade ruhr de bochum, na alemanha, se entusiasmou com a possibilidade de ministrar, entre 1979 e 1980, seminários sobre arte moderna voltados aos trabalhadores da fábrica da bayer, em leverkusen. seu programa baseava-se no princípio de que a arte moderna toca não apenas os peritos, mas também aqueles que não tiveram formação estética. estes poderiam dizer, durante os encontros, tudo aquilo que percebiam e pensavam sobre as obras de artistas como josef albers, barnett newman, max bill, victor vasarely, picasso e mondrian – selecionadas e reproduzidas pelo professor para uma plateia formada por funcionários de colarinho azul e colarinho branco. como forma de estimular que os trabalhadores protagonizassem as discussões sobre arte, imdahl conclamava-os: “meu desejo é que vocês deixem suas mentes falar”, uma vez que “bom é aquilo que é dito honestamente, e isso é o principal”. herdeiro do romantismo, o professor repetia a cada um de seus interlocutores: “tudo o que posso lhe dizer é que eu não sei mais do que você”. esse defensor da “igualdade das inteligências e das burrices” (algo que nos leva a pensar em rancière) operava, contudo, com uma lógica previsível, sempre propondo as questões e selecionando as respostas que daí surgiam. ao fazê-lo, reformulava os comentários dos trabalhadores em função dos resultados por ele almejados. foi o que se deu com a discussão em torno do quadro “o sonho”, de picasso. retendo a afirmação de um participante, de que a figura retratada “sonha e, por tudo que sei, pensa em sua irmã ou mãe”, o professor o congratula: “eu gosto do que você diz”, para na sequência reorientar o enunciado, recapitulando a ideia nesses termos: “agora, se eu puder simplesmente repetir o que foi dito aqui, por que isso é muito importante, a pessoa representada sonha com o seu próprio outro eu, o qual ela deseja ser. agora sigamos em frente!”. embora seu interlocutor tenha consentido que “sim, foi o que eu disse”, alguém do fundo pede a palavra, dirigindo-se ao professor: “você está tentando nos convencer de algo aqui”, acrescentando: “você está continuamente transformando nossas opiniões e, dessa forma, modificando-as”.
(fonte: niels werber, o populismo como uma forma de mediação)